
Um país em cinzas, um planeta em alerta
No ano de 2024, o Brasil viveu uma temporada de fogo sem precedentes: 30,8 milhões de hectares de vegetação foram queimados — uma área quase do tamanho da Itália — segundo o Monitor do Fogo do MapBiomas.
O número representa um aumento assustador de 79 % em relação a 2023, sinal de que o fogo deixou de ser um evento isolado e passou a ser uma crise nacional com impactos globais.
Na Pré-COP, realizada em Brasília no início de outubro de 2025, o governo brasileiro apresentou uma proposta inédita: criar uma resposta global para os incêndios florestais, elevando o tema ao mesmo patamar de outras emergências climáticas como secas, enchentes e perda de biodiversidade.
A proposta brasileira: transformar o fogo em pauta global
A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, defendeu que o mundo precisa de uma gestão integrada do fogo, com cooperação internacional, troca de tecnologias e reconhecimento dos saberes indígenas sobre o uso ecológico das queimadas.
“O fogo não conhece fronteiras. É uma ameaça planetária e precisa de uma resposta planetária”, disse a ministra durante o evento.
A proposta será formalizada durante a COP30, que ocorrerá em Belém (PA) em novembro de 2025.
O texto provisório do “Chamado à Ação Global” propõe cinco eixos de atuação:
- Prevenção – políticas públicas e monitoramento de risco;
- Preparação – capacitação de brigadas e sistemas de alerta;
- Resposta – ação rápida e coordenada;
- Recuperação – restauração ambiental e apoio a comunidades atingidas;
- Uso ecológico do fogo – especialmente em áreas indígenas e tradicionais.
Amazônia: o coração em chamas

Em 2024, a Amazônia concentrou cerca de 17,9 milhões de hectares queimados — 58 % do total nacional.
O fogo invadiu regiões de floresta densa que historicamente não queimavam, alterando ecossistemas e empurrando espécies para o colapso.
Cientistas alertam que, se esse ritmo continuar, a Amazônia poderá atingir o chamado “ponto de não retorno”, onde parte da floresta se transforma em savana degradada.
No Cerrado, os incêndios consumiram 9,7 milhões de hectares, 85 % em vegetação nativa.
O Pantanal teve aumento recorde: 2,2 milhões de hectares, um crescimento de 157 % acima da média histórica.
Até mesmo a Mata Atlântica, que normalmente sofre menos com o fogo, teve 1,2 milhão de hectares queimados, 261 % acima da média recente.
Esses números, divulgados em 22 de janeiro de 2025 pelo MapBiomas Fogo, confirmam o tamanho da tragédia ecológica.
O que está em jogo
A resposta global proposta pelo Brasil vai além da diplomacia ambiental:
- Quer atrair financiamento internacional para prevenção e combate;
- Integrar dados de satélite, monitoramento em tempo real e inteligência climática;
- E incluir os povos indígenas e tradicionais como protagonistas na gestão do fogo — algo inédito em pactos climáticos.
Mas há desafios: especialistas apontam que sem governança local eficiente, fiscalização ambiental forte e continuidade política, o plano pode morrer no papel.
“O discurso é correto, mas sem orçamento e estrutura de resposta, continua sendo só fumaça”, comenta o pesquisador Tasso Azevedo, coordenador do MapBiomas.
Um problema que queima fronteiras
Os incêndios no Brasil emitem bilhões de toneladas de CO₂, afetando o clima global, a chuva na América do Sul e até o regime de ventos no Atlântico.
A fuligem viaja milhares de quilômetros, escurecendo céus em países vizinhos e comprometendo a saúde de milhões de pessoas.
A Organização Meteorológica Mundial alertou, em fevereiro de 2025, que o aumento da temperatura e os eventos extremos criam um “novo normal” de incêndios fora de controle — o Brasil é hoje um dos epicentros dessa mudança climática.
Entre a esperança e as cinzas
O Brasil, que ardeu em 2024, agora tenta reacender a esperança.
Ao propor uma resposta global, o país quer transformar a dor em liderança ambiental.
Mas a pergunta que ecoa entre a fumaça é: seremos capazes de apagar o fogo que nós mesmos acendemos?
📊 Infográfico — “O Brasil em Chamas (2019–2024)”

Fonte: MapBiomas Fogo / Monitor do Fogo – Dados divulgados em 22 de janeiro de 2025.http://jornalfactual.com.br