
Os caminhões da ajuda humanitária começaram a cruzar, mais uma vez, a fronteira sul de Gaza. Trazem sacos de farinha, caixas de medicamentos e, sobretudo, uma esperança frágil — esperança que precisa se equilibrar sobre ruínas, sobre as sombras das casas que já não existem e sobre o som constante de vozes procurando nomes entre os destroços.
A entrada dos comboios é fruto de longas negociações mediadas pela ONU, Egito e Qatar, um fio tênue de cooperação em meio ao colapso. Mas enquanto alimentos e remédios tentam vencer o cerco, outro impasse ganha contornos cada vez mais sombrios: a disputa pelos corpos dos reféns — símbolo de uma dor que atravessa fronteiras e desafia a própria humanidade.
Famílias israelenses imploram pela devolução dos restos mortais de seus entes, enquanto famílias palestinas buscam os seus entre valas improvisadas. O luto não escolhe lado. A morte, aqui, fala todas as línguas.

Nos abrigos improvisados, crianças desenham o céu em pedaços de papel sujos de poeira. Algumas ainda acreditam que o amanhã pode ter cor. Outras apenas observam o horizonte — uma linha onde o som dos drones substituiu o canto dos pássaros.
A ajuda chega, mas é insuficiente. A fome avança como um exército silencioso. Médicos operam à luz de lanternas, partilham morfina e esperança em doses iguais. “Não estamos salvando vidas, estamos apenas adiando a morte”, confessa um voluntário francês, com os olhos marejados de exaustão.
E ainda assim, entre os gritos e o pó, a vida insiste. Mulheres preparam pão em fogões improvisados. Jovens limpam as ruas para abrir passagem. Há uma força invisível — a mesma que sustenta quem perdeu tudo e mesmo assim continua de pé.

No campo político, líderes falam de cessar-fogo e negociações, mas para quem sobrevive sob o som das explosões, a diplomacia parece uma língua distante. Em Gaza, o tempo é contado em sirenes, em nomes riscados de listas e em caminhões que chegam tarde demais.
A luta continua — não apenas pelo território, mas pela memória, pelo direito de existir, pelo retorno digno dos corpos e pelo recomeço de um povo que se recusa a desaparecer.
Entre os escombros, a humanidade ainda pulsa, mesmo ferida, mesmo cansada. Porque a paz, aqui, ainda é uma palavra sussurrada — mas nunca esquecida.